quarta-feira, 27 de junho de 2012

ISENCAO DE TRIBUTOS NO TRANSPORTE INTERNACIONAL DE CARGAS NAO SE APLICA AO TRECHO INTERNO

Isenção de tributos no transporte internacional de cargas não se aplica ao trecho interno
O transporte interno de mercadoria destinada à exportação, realizado entre o estabelecimento produtor e o porto ou aeroporto, não configura transporte internacional, por isso não pode ser alcançado pela isenção da Cofins e do PIS/Pasep prevista na Medida Provisória 2.158-35/00. Com base nesse entendimento, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso especial interposto pela fazenda nacional para reformar decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1).

O TRF1 havia rejeitado a apelação da União em um processo, por considerar que, se o objetivo da norma é tornar o produto nacional mais competitivo no mercado internacional, não faria sentido a cobrança da Cofins e do PIS/Pasep sobre o custo do transporte interno de mercadorias a serem exportadas.

Não satisfeita, a União entrou com recurso especial no STJ alegando falta de provas de que a transportadora beneficiada com a decisão realizasse efetivamente o transporte internacional de cargas. Defendeu ainda a interpretação literal e restritiva das isenções, de modo a excluir o trecho interno do transporte no caso de mercadorias destinadas ao exterior.

Ao analisar o recurso, o relator, ministro Castro Meira, observou não haver dúvida na tese sustentada pela fazenda nacional, uma vez que a MP 2.158-35 deixa claro que a isenção dos tributos não permite sua extensão ao transporte interno. Diante disso, deu provimento ao recurso especial, no que foi acompanhado pela maioria dos integrantes da Turma.

Como precedente, o ministro citou decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que, ao examinar o artigo 155 da Constituição Federal, entendeu que a imunidade tributária de ICMS ali prevista não se destinava ao transporte interno que antecedia a exportação. O ministro salientou que, embora aquela norma se refira ao ICMS, a interpretação serve como suporte para esclarecer o alcance da MP.

IRPF: PLANILHAS ELABORADAS PELA PGFN TEM PRESUNCAO DE LEGITIMIDADE

IRPF: planilhas elaboradas pela PGFN têm presunção de legitimidade
Os dados informados em planilhas elaboradas pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) constituem prova idônea, dotada de presunção de veracidade e legitimidade. Esse é o entendimento da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento de recurso representativo de controvérsia sob o rito do artigo 543-C do Código de Processo Civil.

Em sede de embargos à execução contra a fazenda pública, em que se discute a repetição de Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), a Primeira Seção deu provimento a recurso especial da fazenda nacional contra decisão que considerou as planilhas documentos inidôneos, uma vez que foram produzidas unilateralmente, o que caracterizaria apenas uma declaração particular.

Para promover a compensação de valores de Imposto de Renda indevidamente retidos na fonte com os valores restituídos apurados na declaração anual, a PGFN elaborou planilhas com dados obtidos na Secretaria da Receita Federal. Segundo o órgão público, os contribuintes não contestaram os dados apresentados.

O ministro Mauro Campbell Marques, relator do recurso, afirmou que não se pode tratar como documento particular as planilhas elaboradas pela PGFN e adotadas em suas petições com base em dados obtidos junto à Receita Federal. “Trata-se de verdadeiros atos administrativos enunciativos que, por isso, gozam do atributo de presunção de legitimidade”, ressaltou o ministro no voto.

Os dados informados nas referidas planilhas, segundo o relator, constituem prova idônea, dotada de presunção de veracidade e legitimidade, cabendo à parte contrária demonstrar fato impeditivo ou extintivo do direito da fazenda nacional.

Seguindo as considerações do relator, a Seção deu parcial provimento ao recurso para determinar o retorno do processo ao tribunal de origem, que deve analisar a ocorrência ou não de excesso de execução contra a fazenda pública.

DECISAO DO STF ALTERA ENTENDIMENTO DO STJ SOBRE PRESCRICAO EM ACAO DE REPETICAO DE INDEBITO



O critério de discriminação para verificar o prazo aplicável para a repetição de indébito dos tributos sujeitos a lançamento por homologação (dentre os quais o Imposto de Renda) é a data do ajuizamento da ação em confronto com a data da vigência da Lei Complementar 118/05 (9 de junho de 2005). A decisão é da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reformou seu entendimento para acompanhar a interpretação do Supremo Tribunal Federal (STF).

A mudança de posição ocorreu no julgamento de recurso repetitivo, que segue o rito do artigo 543-C do Código de Processo Civil (CPC). As decisões em recurso representativo de controvérsia servem de orientação para todos os juízes e tribunais em processos que tratam da mesma questão. Anteriormente, a posição adotada pelo STJ era no sentido de adotar como critério de discriminação a data do pagamento em confronto com a data da vigência da LC 118.

O entendimento antigo gerava a compreensão de que, para os pagamentos efetuados antes de 9 de junho de 2005, o prazo para a repetição do indébito era de cinco anos (artigo 168, I, do Código Tributário Nacional) contados a partir do fim do outro prazo de cinco anos a que se refere o artigo 150, parágrafo 4º, do CTN, totalizando dez anos a contar da data da ocorrência do fato gerador (tese dos 5+5).

Já para os pagamentos efetuados a partir de 9 de junho de 2005, o prazo para a repetição do indébito era de cinco anos a contar da data do pagamento (artigo 168, I, do CTN). Essa tese havia sido fixada pela Primeira Seção no julgamento do Recurso Especial (REsp) 1.002.932, também recurso repetitivo.

Entretanto, no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 566.621, o STF observou que deve ser levado em consideração para o novo regime a data do ajuizamento da ação. Assim, nas ações ajuizadas antes da vigência da LC 118, aplica-se o prazo prescricional de dez anos a contar da data da ocorrência do fato gerador (tese dos 5+5). Já nas ações ajuizadas a partir de 9 de junho de 2005, aplica-se o prazo prescricional de cinco anos contados da data do pagamento indevido.

Retroatividade
O STF confirmou que a segunda parte do artigo 4º da LC 118 é inconstitucional, pois determina a aplicação retroativa da nova legislação. Entendeu-se que não se tratava apenas de “lei interpretativa”, pois ela trouxe uma inovação normativa ao reduzir o prazo para contestar o pagamento indevido de dez para cinco anos.

Segundo a decisão do STF, instituir lei que altera prazos e afeta ações retroativamente sem criar regras de transição ofende o princípio da segurança jurídica.

O relator do novo recurso repetitivo no STJ, ministro Mauro Campbell Marques, apontou que a jurisprudência da Corte na matéria foi construída em interpretação de princípios constitucionais. “Urge inclinar-se esta Casa ao decidido pela Corte Suprema, competente para dar a palavra final em temas de tal jaez, notadamente em havendo julgamento de mérito em repercussão geral no recurso extraordinário”, ressaltou.

O ministro Campbell observou que a ação que deu origem ao novo repetitivo foi ajuizada em 15 de junho de 2009. O alegado pagamento indevido de Imposto de Renda sobre férias-prêmio ocorreu em abril de 2003. Pelo antigo entendimento do STJ, ainda não teria ocorrido a prescrição, pois o prazo para ajuizar a repetição de indébito seria de dez anos.

Entretanto, seguindo as novas diretrizes do STF, a Seção negou o recurso, considerando que, como a ação foi proposta após a vigência da nova lei, o prazo prescricional acabou em abril de 2008, cinco anos após o recolhimento do tributo.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

É NECESSARIA A CONSTITUICAO DEFINITIVA DO CREDITO TRIBUTARIO PARA CONFIGURAR O CRIME DE DESCAMINHO

É necessária a constituição definitiva do crédito tributário para configurar crime de descaminho Para configuração do crime de descaminho, é necessária a prévia constituição do crédito tributário na esfera administrativa. Com esse entendimento, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) trancou ação penal contra duas pessoas denunciadas pelo crime previsto no artigo 334 do Código Penal (CP). Segundo os ministros, é inadmissível o uso da ação penal antes da conclusão do procedimento administrativo.

Os denunciados foram encontrados com mercadorias estrangeiras introduzidas irregularmente em território nacional, sem recolhimento dos impostos devidos. Eles traziam mercadorias nos valores de R$ 12.776,48 e R$ 17.085,41. Outros dois corréus, com produtos nos valores de R$ 9.185,70 e R$ 8.350,64, também foram denunciados pelo mesmo crime, mas a denúncia contra eles foi rejeitada com base no princípio da insignificância.

Inconformada, a Defensoria Pública da União impetrou habeas corpus no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), sustentando que não houve prévia constituição do crédito tributário no âmbito administrativo, o que impediria o início da ação penal. O tribunal denegou a ordem, ao concluir que a constituição do crédito não seria condição de punibilidade.

No STJ, os recorrentes buscaram o provimento do recurso ordinário em habeas corpus, “para determinar o trancamento definitivo do processo penal, em relação ao suposto delito de descaminho”.

Jurisprudência

O ministro relator, Marco Aurélio Bellizze, lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que “a pendência de procedimento administrativo fiscal impede a instauração da ação penal, bem como de inquérito policial, relativos aos crimes contra a ordem tributária, já que a consumação dos delitos somente ocorre após a constituição definitiva do crédito tributário”.

De acordo com a Súmula Vinculante 24 do STF, não se tipifica crime material contra a ordem tributária antes do lançamento definitivo do tributo. Para Bellizze, diante dessa súmula, a constituição definitiva do crédito tributário não pode ser dispensada na configuração do delito de descaminho.

O ministro ressaltou que há na doutrina posição que considera o não pagamento do tributo suficiente para a consumação do crime de descaminho, que seria um delito formal. Mas ele discorda. “O direito penal só deve intervir nos casos de ataques muito graves aos bens jurídicos mais importantes”, afirmou.
Para Bellizze, ao tipificar o delito de descaminho, o intuito do legislador foi o de evitar o não recolhimento do imposto devido. “Quitando-se o tributo devido, descaracteriza-se o delito de descaminho”, ponderou.

Procedimento administrativo
Atento à similitude existente entre o delito de descaminho e os crimes contra a ordem tributária, o STJ passou a adotar decisões no sentido de que é possível extinguir a punição pelo pagamento do tributo, nos casos de crimes descritos no artigo 334 do CP. Portanto, segundo Bellizze, é inaceitável a utilização da ação penal como forma de forçar o acusado a pagar tributo antes do fim do processo administrativo fiscal.

Segundo o voto do ministro, para que o fisco exija o valor devido a título de tributo, é necessária a realização de procedimento administrativo, para verificar o fato que gerou a obrigação, calcular o tributo devido e identificar o sujeito passivo, e, se for o caso, propor a aplicação da penalidade.

O relator ressaltou que apenas a autoridade administrativa tem competência para avaliar a existência do tributo. Além disso, o contribuinte tem o direito de discutir, administrativamente, se realmente há o tributo e, se for vencido, ele poderá ser intimado a pagar o valor devido, dentro de 30 dias.

O ministro citou que, em consulta ao site da Secretaria da Receita Federal – Seção de Controle e Acompanhamento Tributário, confirmou-se que ainda não foram avaliados os recursos administrativos apresentados pela defesa dos recorrentes. Por essa razão, a Turma deu provimento ao recurso em habeas corpus para trancar a ação penal.

TELEFONIA PODE COMPENSAR CREDITOS DE ICMS SOBRE ENERGIA



O ICMS incidente sobre energia elétrica consumida pelas empresas de telefonia pode ser creditado para abatimento do imposto devido na prestação dos serviços. A decisão é da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Por maioria de votos, os ministros consideraram que o artigo 1º do Decreto 640/62 – que equiparou, para todos os efeitos legais, os serviços de telecomunicações à indústria básica – é compatível com o ordenamento jurídico em vigor, em especial com a Lei Geral de Telecomunicações, com o Regulamento do IPI e com o Código Tributário Nacional (CTN).

A decisão foi tomada no julgamento de recurso do Estado do Rio Grande do Sul contra decisão do tribunal de justiça gaúcho, que reconheceu a possibilidade de a Brasil Telecom creditar-se de ICMS incidente sobre a energia elétrica que utiliza nas centrais telefônicas para prestação de seus serviços.

O governo gaúcho apontou que a Lei Complementar 87/96 autoriza esse creditamento quando a energia é consumida no processo de industrialização e alega que a atividade de telefonia é prestação de serviço, que não pode ser equiparada à atividade industrial para fins de tributação.

Equiparação
De acordo com o ministro Castro Meira, a expressão “para todos os efeitos legais” contida no Decreto 640/62 deixa claro que a equiparação serve a todos os ramos do direito, inclusive o tributário, já que a norma não previu qualquer condicionante ou restrição. Para ele, não há incompatibilidade entre qualificar uma atividade como serviço e equipará-la, para determinados fins, à indústria.

O ministro destacou que o inciso II do artigo 155 da Constituição Federal estabelece que o ICMS não é cumulativo na circulação de mercadorias e na prestação de serviços de transporte e comunicação.

A maioria dos ministros também entendeu que a energia, senão o único, é o principal insumo utilizado na prestação dos serviços de telecomunicação, que só é possível em razão da energia elétrica utilizada. “Nos serviços de telecomunicação, a energia, além de essencial, revela-se como único insumo, de modo que impedir o creditamento equivale a tornar o imposto cumulativo, em afronta ao texto constitucional”, afirmou Castro Meira.

Debate intenso
A questão foi profundamente analisada. O recurso foi distribuído inicialmente ao ministro Luiz Fux, hoje no Supremo Tribunal Federal. Ele negou provimento ao recurso e houve pedido de vista antecipada do ministro Hamilton Carvalhido, que está aposentado. Carvalhido acompanhou o relator. O ministro Herman Benjamin pediu vista e divergiu. Entendeu que o CTN, a Lei Geral de Telecomunicações e o Regulamento do IPI haviam revogado materialmente o Decreto 640/62.

Diante na divergência inaugurada, o ministro Castro Meira pediu vista e acompanhou o relator. O ministro Humberto Martins votou no mesmo sentido. O ministro Mauro Campbell Marques também pediu vista e negou provimento ao recurso. Veio então o pedido de vista do ministro Benedito Gonçalves, que votou com a maioria, bem como o ministro Arnaldo Esteves Lima, com ressalvas.

Assim, por maioria de votos, a Seção negou provimento ao recurso, ficando vencido o ministro Herman Benjamin. Como o ministro Luiz Fux não integra mais o STJ, o ministro Castro Meira é o relator do acórdão.

CONVENCOES CONTRA BITRIBUTACAO PREVALECEM SOBRE LEGISLACAO DO IMPOSTO DE RENDA


A fazenda nacional não pode exigir retenção de Imposto de Renda na fonte em caso de serviços prestados a cliente nacional por empresa estrangeira não estabelecida no Brasil. Para a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os acordos internacionais contra bitributação são especiais em relação à lei que trata do Imposto de Renda.

O caso diz respeito a convenções firmadas pelo Brasil com Alemanha e Canadá. A decisão contraria a pretensão da fazenda de cobrar, na fonte, a título de imposto sobre rendimento, 25% do pagamento feito pela empresa nacional à estrangeira. Os serviços dizem respeito a contratos de prestação de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de tecnologia.

Segundo a fazenda, o montante não poderia ser classificado como lucro da empresa estrangeira, já que esse lucro só seria conhecido ao final do exercício. O pagamento não constituiria lucro, mas apenas envio de receita. A convenção excluiria apenas a incidência da tributação sobre lucros. Além disso, a lei nacional deveria se sobrepor às convenções, anteriores à Constituição.

Lucro operacional
O ministro Castro Meira, porém, apontou que o conceito de lucro apresentado pela fazenda nacional não corresponde ao previsto nas convenções. Conforme o relator, o termo “lucro da empresa estrangeira” contido nas duas convenções não se refere ao "lucro real", mas ao “lucro operacional”.

“A tese é engenhosa, mas não convence”, afirmou o ministro. “É regra de hermenêutica que devem ser rechaçadas as interpretações que levem ao absurdo, como é o caso da interpretação aqui defendida pela fazenda nacional”, completou.

“Do contrário, não haveria materialidade possível sobre a qual incidir o dispositivo, porque todo e qualquer pagamento ou remuneração remetido ao estrangeiro está – e estará sempre – sujeito a adições e subtrações ao longo do exercício financeiro”, esclareceu.

“A tributação do rendimento somente no estado de destino permite que lá sejam realizados os ajustes necessários à apuração do lucro efetivamente tributável. Caso se admita a retenção antecipada – e portanto, definitiva – do tributo na fonte pagadora, como pretende a fazenda nacional, serão inviáveis os referidos ajustes, afastando-se a possibilidade de compensação se apurado lucro real negativo no final do exercício financeiro”, afirmou Castro Meira.

Revogação funcional
Quanto ao alegado conflito entre a lei tributária interna e as convenções internacionais, o ministro apontou que ele deve ser resolvido segundo o critério de especialidade da norma. Não se trataria, portanto, de revogação própria da lei pela convenção.

“A norma interna perde a sua aplicabilidade naquele caso específico, mas não perde a sua existência ou validade em relação ao sistema normativo interno. Ocorre uma revogação funcional”, afirmou o relator.

“A prevalência dos tratados internacionais tributários decorre não do fato de serem normas internacionais, e muito menos de qualquer relação hierárquica, mas de serem especiais em relação às normas internas”, completou.

Globalização

O ministro apontou ainda que a bitributação vincula-se à soberania nacional e pode ser exercida pelos estados nacionais. Porém, constitui “patologia tributária”, combatida por meio de acordos bi ou multilaterais, por meio dos quais as partes transacionam a não incidência de certos tributos em certas condições.

“Ocorre que, na prática, quando os rendimentos são disponibilizados e devem ser submetidos à tributação, o fisco quase sempre adota uma interpretação literal e restritiva das normas convencionais, o que culmina com a não aplicação do acordo. É justamente o caso dos autos”, asseverou.

COMISSAO DO NOVO CP APROVA BENEFICIOS PARA DEVEDORES DO FISCO E DA PREVIDENCIA



Em votação apertada após debate acalorado, a comissão de juristas que prepara o anteprojeto para o novo Código Penal aprovou na noite desta quinta-feira (24) proposta que altera significativamente o tratamento penal dos crimes contra a ordem tributária e previdência social. Uma delas traz a possibilidade de suspensão do processo, em qualquer fase, caso o devedor apresente em juízo caução que assegure a futura quitação.

Noutra hipótese, a pretensão punitiva do estado e a prescrição ficariam suspensas se, antes do recebimento da denúncia, for celebrado e estiver sendo cumprido acordo de parcelamento. Em caso de seu cumprimento integral, a punibilidade é extinta, de acordo com a proposta.

A comissão incorporou algumas práticas fruto da jurisprudência sobre o tema. O pagamento dos valores dos tributos, contribuições sociais e previdenciárias, inclusive acessórios, extingue a punibilidade se efetuado até o recebimento da denúncia, assim considerado o momento posterior à resposta preliminar do acusado. Se posterior, reduz a pena de um sexto a metade.

A proposta aprovada encampa a jurisprudência também quanto ao momento da consumação. De acordo com o texto, “os crimes de fraude fiscal ou previdenciária não se tipificam antes do lançamento definitivo do tributo ou contribuição social, data da qual começará a correr o prazo de prescrição”.

A proposta aprovada ainda estabelece que o uso de documento falso (crime de falso) será absorvido pela fraude fiscal ou previdenciária, quando este se exaure sem mais potencialidade lesiva. Além disso, determina que não haja crime se o valor correspondente à lesão for inferior àquele usado pela Fazenda Pública para a execução fiscal. Atualmente, no entender da administração, débitos de até R$ 20 mil não justificam o processamento da cobrança.

Por maioria

Dos 15 juristas que compõem a comissão, nove estavam presentes no momento da votação – cinco votaram pela criação dos benefícios aos devedores; quatro votaram contra. O relator do anteprojeto, procurador regional da República Luiz Carlos Gonçalves, lamentou a proposta aprovada. Para ele, significa o fim dos crimes tributários no Brasil. “Criamos o mais fantástico acervo de benefícios que um réu pode receber. Aceitamos um direito penal cobrador de tributos. Estendemos à fraude um tapete vermelho, como se a condição de devedor fosse algo vantajoso”, protestou.

O relator explicou que, caso a proposta seja aceita pelo Congresso Nacional quando os parlamentares apreciarem o texto do novo Código Penal, cria-se o paradoxo de tratar diferentemente quem comete o mesmo crime. “Aquele que tem dinheiro para prestar a caução, tem o processo suspenso; aquele que não tem, pode ser condenado”.

O texto aprovado afirma que a configuração do crime também dependerá da ocorrência de fraude. Para o crime de fraude fiscal ou previdenciária, a pena aprovada foi de dois a cinco anos. A conduta caracteriza-se por “obter para si ou para terceiro, vantagem ilícita consistente na redução ou supressão de valor de tributo, contribuição social ou previdenciária, inclusive acessórios”. A comissão considera fraude, por exemplo, deixar de repassar, no prazo devido, valores de tributo, contribuição social ou previdenciária, que devam ser recolhidos aos cofres públicos por disposição legal ou convencional.

Descaminho

Durante a tarde, os juristas também aprovaram a redação do crime de descaminho (introduzir mercadoria no país, ou sua saída, sem o pagamento dos tributos ou contribuições devidos), com pena de um a três anos. Aproveitar-se, de qualquer modo, destas mercadorias descaminhadas no exercício de atividade comercial ou industrial, ainda que irregular ou informal, terá pena de dois a quatro anos.

Na mesma linha do que foi aprovado sobre as fraudes ao fisco e à previdência, a proposta aplica ao descaminho toda a disciplina de extinção de punibilidade, de tipicidade e de insignificância referente aos crimes tributários.

Crimes econômicos

A comissão trouxe para o texto do novo código algumas condutas previstas na Lei 8.137 (revogando seus artigos 5º e 6º) e incorporando Lei 12.529, que recém entrou em vigor. “Depois de todo o debate que houve, não teria sentido criminalizar condutas que já foram retiradas pela lei”, explicou o advogado Marcelo Leal, autor da proposta.

A formação de cartel ficou definida como “abusar do poder econômico, dominando o mercado, eliminando total ou parcialmente a concorrência mediante qualquer forma de ajuste ou acordo de empresa”. A pena será de dois a cinco anos e multa. A comissão aprovou a incorporação ao novo código de alguns dispositivos que tratam de concorrência desleal.

Telecomunicações
Ainda houve a aprovação da redação sobre os crimes de telecomunicações. Entre eles, “exercer, desenvolver, ou utilizar clandestinamente atividade de telecomunicação ou instalar qualquer aparelho para tanto”. A pena será de um a três anos. O texto ainda favorece a situação de rádios comunitárias e prevê o agravamento da pena quando o sinal clandestino interfere na operação de aeroportos.

A comissão, presidida pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gilson Dipp, volta a se reunir na sexta-feira (25), a partir das 9h, para apreciar propostas de alteração relativas aos crimes ambientais, patrimoniais, hediondos, militares. Ainda estão na pauta crime de intolerância, de responsabilidade e da Lei 7.805/89 (lavra de minerais), além do tema prescrição.